domingo, outubro 17, 2010

Livros

Comprei-o porque estava a um bom preço, pensando que era mais um daqueles livros com um diagnóstico sobre o choque de civilizações. Enganei-me. O problema surge como pano de fundo, claro, mas as três partes do livro são uma explicação, no campo da História das Ideias, da forma como o pensamento político de fundamentação teológica foi perdendo terreno no Ocidente. Hobbes não poderia deixar de aparecer. Transcrevo a paráfrase da sua explicação da origem da vida política:

A partir do momento em que os homens criam um deus, especialmente o Deus majestoso do monoteísmo, começam igualmente a temê-lo. Antevendo a lenda do golem e o Frankenstein de Mary Shelley, Hobbes sugere que os homens são perseguidos pelas suas próprias fantasias de dominar o destino natural. Ao seu temor pela natureza, acresce o temor de um deus caprichoso, sempre descontente porque nós nunca o servimos perfeitamente. Uma nova cultura de medo floresce para completar o temor da natureza, uma cultura na qual as pessoas têm visões estranhas e superstições ainda mais estranhas sobre como apaziguar Deus. Em vez de estudar a natureza para a dominar com as suas limitadas faculdades, os homens voltaram-se ingenuamente para aqueles que tinham pretensões de conjurar «coisas invisíveis». Ignorantes das verdadeiras causas, viraram-se para aqueles que tinham ambições de as controlar: xamãs, sacerdotes, fazedores de milagres. E, quando isto acontece, os homens já não se encontram no seio do reino da crença privada, mas na esfera pública da política. 

Mark Lilla. A Grande Separação. Religião, Política e o Ocidente Moderno. Gradiva, 2010.

(também aqui)