É universalmente reconhecido que há uma grande uniformidade nas acções dos homens, em todas as épocas e nações, e que a natureza humana permanece sempre a mesma nos seus princípios e operações. Os mesmos motivos produzem sempre as mesmas acções; os mesmos acontecimentos seguem-se sempre das mesmas causas. A ambição, a avareza, o interesse pessoal, a vaidade, a amizade, a generosidade, o espírito público; estas paixões, misturadas em diversos graus e distribuídas por toda a sociedade, têm sido desde o início do mundo, e ainda são, a fonte de todas as acções e iniciativas que têm sido observadas entre os homens. Quer-se conhecer os sentimentos, inclinações e modo de vida dos gregos e romanos? Estude-se bem o temperamento e as acções dos franceses e ingleses: não se estará muito enganado ao transferir para os primeiros a maior parte das observações feitas sobre os segundos. A humanidade é tão semelhante, em todas as épocas e lugares, que, sob este aspecto, a história nada tem de novo ou estranho a nos oferecer. A sua principal utilidade consiste apenas em revelar os princípios constantes e universais da natureza humana, mostrando os homens nas mais variadas circunstâncias e situações, e oferecendo-nos os materiais a partir dos quais podemos ordenar as nossas observações e nos familiarizarmos com os motivos normais da acção e comportamento humanos. Esses registos de guerras, intrigas, sedições e revoltas são colecções de experimentos pelos quais o político ou filósofo moral fixa os princípios da sua ciência, do mesmo modo que o físico ou filósofo natural se familiariza com a natureza através dos experimentos que realiza com eles. E a terra, a água e outros elementos examinados por Aristóteles e Hipócrates não se assemelham mais aos que actualmente se oferecem à nossa observação do que os homens descritos por Políbio e Tácito se parecem com os que agora governam o mundo.
David Hume. Tratados Filosóficos. I - Investigação sobre o Entendimento Humano. Tradução e introdução de João Paulo Monteiro. Lisboa: IN-CM, pp. 95-96 (secção VIII - Da Liberdade e da Necessidade)