Hans Reiter disse que não sabia qual era a diferença entre um bom livro divução (divulgação) e um bom livro liário (literário). Haldes explicou-lhe que a diferença consistia na beleza, na beleza da história que se contava e na beleza das palavras com que se contava essa história. (p. 754)
A história de 2666 faz pensar que estamos perante um livro que 'tem dentro toda a humanidade', como se Roberto Bolaño tivesse pretendido captar muito mais do que «duas ou três coisas da vida» (p. 222). As referências à literatura enquanto reflexão sobre o humano, sobre aquilo que configura o humano, aparecem ao longo das mais de 1000 páginas (a edição que tenho é a da Quetzal/Fnac), sugerindo-se em vários momentos que essa reflexão está sempre em jogo na literatura porque é aqui, nesta «floresta» (p. 901), que o sentido se perde e nós podemos contemplar a beleza e a monstruosidade («Eu também acredito na bondade intrínseca do ser humano, mas isso não significa nada», p. 900). A imagem da floresta permite também descrever a obra, se pensarmos que no livro de Bolaño há muitos caminhos, tendo cada personagem uma história, uma vida que daria um outro romance.
Na última parte, Bolaño narra a vida de um escritor. É belíssima a forma como descreve a percepção especial de Hans Reiter, que, em pequeno, caminhava «pela superfície da terra como um mergulhador novato no fundo do mar» (p. 734). Na infância, Reiter era um menino singular que mergulhava de olhos abertos, um gigante à procura da sua linguagem, um gigante que dizia "liário" em vez de "literário". Descrições como esta confirmam a ideia de que 'toda a poesia pode estar contida num romance' (p. 889). O menino-alga é de facto a imagem justa de quem vê o mundo de outra perspectiva, como se estivesse do outro lado, e o mar fosse, afinal, a morte: «Comentei com ele que trabalhar na morgue levá-lo-ia sem dúvida a reflexões atinadas ou pelo menos originais acerca do destino humano. [...] Insisti. Aquele enquadramento, disse eu alargando os braços e abarcando toda a morgue, era de certa maneira o lugar ideal para pensar na brevidade da vida, em como é insondável o destino dos homens, na futilidade dos empenhos mundanos» (p. 906).
A história de 2666 faz pensar que estamos perante um livro que 'tem dentro toda a humanidade', como se Roberto Bolaño tivesse pretendido captar muito mais do que «duas ou três coisas da vida» (p. 222). As referências à literatura enquanto reflexão sobre o humano, sobre aquilo que configura o humano, aparecem ao longo das mais de 1000 páginas (a edição que tenho é a da Quetzal/Fnac), sugerindo-se em vários momentos que essa reflexão está sempre em jogo na literatura porque é aqui, nesta «floresta» (p. 901), que o sentido se perde e nós podemos contemplar a beleza e a monstruosidade («Eu também acredito na bondade intrínseca do ser humano, mas isso não significa nada», p. 900). A imagem da floresta permite também descrever a obra, se pensarmos que no livro de Bolaño há muitos caminhos, tendo cada personagem uma história, uma vida que daria um outro romance.
Na última parte, Bolaño narra a vida de um escritor. É belíssima a forma como descreve a percepção especial de Hans Reiter, que, em pequeno, caminhava «pela superfície da terra como um mergulhador novato no fundo do mar» (p. 734). Na infância, Reiter era um menino singular que mergulhava de olhos abertos, um gigante à procura da sua linguagem, um gigante que dizia "liário" em vez de "literário". Descrições como esta confirmam a ideia de que 'toda a poesia pode estar contida num romance' (p. 889). O menino-alga é de facto a imagem justa de quem vê o mundo de outra perspectiva, como se estivesse do outro lado, e o mar fosse, afinal, a morte: «Comentei com ele que trabalhar na morgue levá-lo-ia sem dúvida a reflexões atinadas ou pelo menos originais acerca do destino humano. [...] Insisti. Aquele enquadramento, disse eu alargando os braços e abarcando toda a morgue, era de certa maneira o lugar ideal para pensar na brevidade da vida, em como é insondável o destino dos homens, na futilidade dos empenhos mundanos» (p. 906).