Este post pretende ser um apontamento. Corrijo: este post só pode ser um apontamento, um texto que se define pela brevidade e (esperemos) pela clareza, porque o filme A Turma (Entre les Murs, de Laurent Cantet) escapa a qualquer interpretação que pretenda reduzir a sua complexidade, a qualquer interpretação que procure, por exemplo, atribuir-lhe à partida um tema. É verdade que a câmara está sempre dentro da escola (no pátio, no sala de aula, na sala do director, na sala de professores, no refeitório) e que, durante a maior parte do tempo, assistimos a uma aula de francês - o que poderia remeter-nos, desde logo, para o tema da educação -, mas também é certo que os momentos de maior tensão no filme correspondem a situações em que alguém abandona a sala de aula. Neste sentido, parece-me que o filme trata, mais propriamente, da capacidade (prefiro "capacidade" a "problema") de resistência à educação que caracteriza o ser humano (e eu gostaria de introduzir aqui o advérbio "felizmente"). Com efeito, a dada altura, um dos alunos dá a entender que é um erro pensar-se que a escola consegue "domar" alguém; certo é que, logo no início do filme, um dos professores exprime a sua impotência, a sua incapacidade de educar, dizendo que os alunos se comportam como animais. A ironia está nisto: se os alunos (as pessoas) fossem como "animais", Pavlov teria resolvido o problema da educação.
Tratar-se de uma aula de Francês, uma aula de língua - língua materna para muito poucos alunos - não é facto despiciendo. A discussão sobre o significado de palavras e expressões que, para alguns alunos, não passam de barulhos sem qualquer sentido, é perfeita como exemplo das dificuldades inerentes ao acto de ensinar. As palavras, como diria um filósofo importante, ganham sentido em jogos de linguagem; e o ponto é que a escola de hoje (dita "inclusiva") tem imensa dificuldade em afirmar-se perante todos os outros jogos. Em certo sentido, o professor da turma de "A Turma" aprende isto mesmo; como consequência do desentendimento com duas alunas, percebe que o significado das palavras não é algo que a escola possa impor.
Por fim, também não será por acaso que o filme termina com uma bela, e justa, descrição do método dialéctico praticado pela personagem principal d' A República. Ao escutar com fascínio a explicação do procedimento maiêutico de Sócrates, explicação apresentada por uma aluna, o professor torna-se o interlocutor visado, ou seja, naquele momento, ele percebe os limites do seu pensamento.