quinta-feira, fevereiro 26, 2009

Melancolia doseada


«Semideuses», uma das crónicas reunidas em Primeira Pessoa (Casa das Letras, 2006), é uma resposta de Pedro Mexia às pessoas que o acusaram de apresentar de si mesmo uma imagem muito negativa, excessivamente desencantada. Mexia responde com Fernando Pessoa. Responde com um poema de Álvaro de Campos que consiste num conjunto de invectivas contra todos os que nunca falharam em nada, contra os que vencem sempre, contra aqueles que estão sempre de bem com a vida. É uma resposta aceitável, que legitima o tom pessoalíssimo dos textos de Primeira Pessoa. Em Nada de Melancolia (Edições tinta-da-china, 2008), livro que reúne as crónicas que apareceram entre Janeiro de 2006 e Abril de 2007 na revista NS do Diário de Notícias, o tom pessoal é ligeiramente atenuado para dar lugar, sobretudo, à enunciação do sentimento de nostalgia. Assim, o tom pessoal já não decorre tanto de uma descrição de si próprio – acompanhada, quase sempre, de auto-ironia –; ele nasce antes da descrição de certos objectos e espaços, aqueles a que a memória conferiu um poder evocativo especial. Entram nesta categoria músicas de Climie Fisher, os telegramas ou o Café Império, que esteve quase a ser substituído - o que não seria coisa de somenos importância - pelo Reino de Deus.