Nas primeiras linhas do conto "Retrato de uma rapariga em vidro", diz-se: «Quanto à minha irmã, ela era ainda mais difícil de definir do que eu» (p. 61). As histórias de Williams são, sobretudo, histórias de pessoas difíceis de definir, pessoas cujas vidas constituem um desafio a tudo o que se apresenta como expectável, ou como o caminho para uma "felicidade razoável". Em certa medida, todas parecem partilhar de uma «secreta sabedoria» (p. 64) sobre o carácter imperfeito da criação («Se Ele, o Criador, não ordenara todas as coisas da melhor maneira [...]», p. 21, conto "A Maldição") e a crueldade a que estão submetidas todas as criaturas («Como é terrível estar à mercê de gente sem piedade!», p. 89, conto "A Noite da Iguana").
Na história da irmã que vive 'num mundo de vidro e de música', o seu retrato - retrato construído por um irmão que escreve poemas - consiste na negação da ideia que o vidro pode, à partida, sugerir, ou seja, a transparência, ou a possibilidade de um sentido sem interpretação. A rapariga retratada, tendo a capacidade de dizer coisas que não primam pela evidência («Nunca descobri o que queria dizer com aquilo», p. 73), é alguém que vive com certos livros e a quem não ocorre que «um livro é uma coisa que se lê e, uma vez acabado, se põe de parte» (p. 65). Em certa medida, este é o retrato de uma pessoa que não encontra sentido na diferença que Flora (conto "A Coisa Importante") estabelece entre a 'realidade ideal' da escrita e a vida (p. 119), ou na diferença entre verdade e poesia (p. 113, conto "A Semelhança entre um estojo de violino e um caixão") e que, por essa razão, admite que as estrelas possam ter cinco pontas. Já no caso de Billy e Cora (conto "Sociedade a dois"), a coerência dos seus actos releva de uma 'espécie de anarquia moral', que rejeita a sociedade sem espaço para a liberdade individual: «Era uma espécie de anarquia moral o que, indubitavelmente, os mantinha juntos, uma verdadeira aversão que comungavam contra tudo o que fosse restritivo e falso na sociedade em que viviam e contra cuja natureza lutavam sem desfalecimentos» (p. 153). Como eles, a irmã do poeta rejeita uma existência ordenada de certo modo, mas (devido a uma maior fragilidade, que o vidro também sugere) exprime essa rejeição vivendo «à espera que a espécie de brilho de pedra preciosa de cada peça arrancasse do seu espírito a dolorosa realidade» (p. 64).
Nas histórias deste pequeno livro (160 páginas), ganha destaque o dom de T. Williams para escrever com uma clareza, um sentido visual e uma fluidez narrativa que não sacrificam o densidade psicológica das personagens. Talvez isto explique também por que razão a sua obra se prestou a tantas adaptações para cinema.