Pensar é fazer, por exemplo, verdades, fazer filosofia.
Ocupar-se é fazer filosofia ou fazer revoluções ou
fazer um cigarro ou fazer footing ou passar o tempo.
Ortega y Gasset
É um pequeno livro, da Biblioteca Editores Independentes (2007). O que é a filosofia? corresponde a um curso dado por Ortega y Gasset em Madrid no ano de 1929. Nas várias lições do curso, torna-se evidente uma intenção de filosofar com "gentileza", de acordo com a acepção da palavra que encontramos na segunda lição: «É evidente que eu hei-de procurar ser entendido por todos, porque [...] a claridade é a gentileza do filósofo» (p. 23).
Para responder à pergunta "o que é a filosofia?", Gasset conta, ao longo do curso, uma história. É a história do que foi a filosofia até à época antifilosófica que marca o final do século XIX, quando os filósofos foram humilhados pelo «imperialismo da física» (p. 37) e o seu trabalho reduzido à teorização do conhecimento (epistemologia), levando ao extremo uma tendência que Kant inaugurara com a ideia de um "tribunal da razão". O ponto de viragem nesta história teve início com a «preocupação filosófica dos físicos» e, explica Gasset, com a conclusão de que os factos não impõem princípios teóricos, isto é, com a aceitação da impossibilidade de se encontrar um fundamento último para as teorias.
A história da filosofia contada por Gasset tem três momentos essenciais. Começa, como não poderia deixar de ser, com os Gregos, que só conheciam «um modo de ser que consiste em exteriorizar-se» (p. 118), e tem uma mudança decisiva em Descartes, o pai da idade moderna que inventou a mente enquanto espaço interior, «recinto» (p. 120) (sublinhe-se que Gasset não esquece a importância de Santo Agostinho na história que conduziu à filosofia cartesiana da subjectividade). O terceiro momento é o da superação do idealismo, e é para este ponto que Gasset pretende conduzir a reflexão dos estudantes, apoiando-se no pensamento de Heidegger. Assim, o nosso modo de ser, argumentará Gasset, é sempre em circunstância, ou, em terminologia heideggeriana, um ser-aí, um existir no mundo que implica estar (pre)ocupado. Por exemplo, a fazer verdades: «Eu consisto num ocupar-me com o que há no mundo e o mundo consiste em tudo aquilo de que me ocupo e em nada mais. Ocupar-se é fazer isto ou aquilo; é, por exemplo, pensar. Pensar é viver porque é ocupar-me com os objectos nessa peculiar faina e convívio com eles que é pensar. Pensar é fazer, por exemplo, verdades, fazer filosofia. Ocupar-se é fazer filosofia ou fazer revoluções ou fazer um cigarro ou fazer footing ou passar o tempo.» (pp. 180-181).